Quem preserva, ganha

22 de September de 2015

Artigo de Marcia Hirota e Mônica Fonseca* originalmente publicado no Valor -  Com o objetivo de valorizar e aumentar o interesse de proprietários de terra pela criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural, as RPPNs, tramita na Câmara dos Deputados do Congresso Nacional o Projeto de Lei 1548/15, de autoria do deputado Sarney Filho (PV-MA), que dispõe sobre a criação, gestão e manejo dessas reservas. O projeto de lei sobre as reservas particulares é resultado de uma construção coletiva, que por mais de um ano reuniu especialistas, representantes do governo, de ONGs, técnicos e estudiosos para debaterem um texto que reafirmasse a importância das RPPNs e servisse como ferramenta de incentivo à criação de novas áreas protegidas. Este novo instrumento vem corrigir uma distorção contida na legislação atual que integrou, de maneira equivocada, a categoria RPPN ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) como unidades de Uso Sustentável, quando na verdade, devido a um veto presidencial, as atividades permitidas nas RPPNs as tipificam como de Proteção Integral. Hoje, apesar de todos os serviços prestados, o único estímulo financeiro ao proprietário de uma RPPN é a isenção de Imposto Territorial Rural (ITR) sobre a parcela da propriedade destinada à criação da reserva. Neste sentido, o projeto de lei apresenta avanços, como possibilitar novas atividades produtivas dentro das reservas – coleta de sementes, instalação de viveiros e comercialização de mudas nativas, por exemplo – ações que podem ser lucrativas, gerar negócios e contribuir para o desenvolvimento regional e a restauração florestal. Outros benefícios são: isenção total do ITR quando a área de RPPN representar mais de 30% de sua área total; créditos agrícolas com taxas e juros menores, bem como limites e prazos maiores que os praticados no mercado; dedução no Imposto de Renda (IR) de todas as despesas efetuadas com a criação, instalação e manutenção da reserva; prioridade ao proprietário da reserva na obtenção de empréstimos, financiamentos e nos programas de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA). Portanto, sem perder seu principal objetivo – que é a conservação –, o novo formato pensado para as RPPNs traz novos elementos capazes de atrair os proprietários de terra do país. Desde que começaram a ser legalmente reconhecidas no Brasil, alcançamos a incrível marca de 1.400 RPPNs criadas, a despeito dos poucos incentivos efetivos. A extensão dessas reservas varia de menos de 1 até mais de 30 mil hectares (ha). Todas elas juntas somam aproximadamente 750 mil ha de áreas protegidas por proprietários privados. Na Mata Atlântica, elas são mais de 900 e preservam aproximadamente 200 mil ha, sendo 90 mil ha distribuídos por 163 reservas criadas ou financiadas por empresas e outros 110 mil ha em 737 reservas instituídas por proprietários engajados com a conservação. Importante lembrar cerca de 80% dos remanescentes florestais da Mata Atlântica estão em áreas privadas, daí a fundamental importância das RPPNs para a preservação do bioma. A razão que motiva esses proprietários a destinarem uma parcela de suas propriedades para a conservação varia bastante. Vai desde o amor à terra até o reconhecimento da importância deste patrimônio na proteção da biodiversidade, solos, mananciais de água, na contribuição à estabilidade climática, entre outros benefícios. Alguns Estados já estabelecerem legislação própria de RPPN, apresentando também modelos de incentivos econômicos que merecem ser divulgados e replicados. O Rio de Janeiro, por exemplo, destina uma parcela dos recursos de compensação ambiental para projetos em RPPNs que possuam atributos relevantes, como espécies e ambientes ameaçados. O município de Varre-Sai, no noroeste do Estado, aprovou legislação que determina o repasse de 60% do valor recebido do ICMS Verde aos proprietários de RPPNs. No Espírito Santo, um projeto de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), chamado Programa Reflorestar, recompensa financeiramente proprietários rurais que mantenham uma parcela de suas terras com cobertura florestal adequada a garantir disponibilidade de água, conservação do solo e biodiversidade. Já no Estado de São Paulo, o PSA para as reservas privadas foi instituído em 2013 com o objetivo de incentivar e fomentar a proteção da biodiversidade em terras privadas e também possibilitando aos proprietários retorno financeiro pelos serviços prestados com a conservação de suas terras. Em Minas Gerais, o Programa Bolsa Verde tem o objetivo de premiar produtores rurais mediante Pagamento por Serviços Ambientais para que conservem, preservem ou recuperem a cobertura vegetal nativa em área de Reserva Legal (RL), RPPN ou Áreas de Preservação Permanente (APPs). Os exemplos acima são alguns dos mecanismos existentes para incentivar a criação de novas RPPNs, mas que hoje, por serem iniciativas regionais, alcançam um número muito reduzido de proprietários. Precisamos, assim, de arcabouços legais mais robustos, lacunas que devem ser preenchidas por projetos de lei, como o PL 792/07, que trata do Pagamento por Serviços Ambientais, em tramitação no Congresso Nacional desde 2007, e agora pelo PL 1548/15, que dispõe sobre as RPPNs. Essa é uma das agendas que integram positivamente os interesses de ambientalistas e produtores rurais. Com esses projetos, pretende-se que as necessidades e anseios dos proprietários interessados em conservação sejam realmente atendidos e seus esforços valorizados, já que as reservas acabam por beneficiar a todos, sobretudo aos próprios proprietário que mantém a floresta preservada. *Marcia Hirota é diretora-executiva da Fundação SOS Mata Atlântica e Mônica Fonseca é consultora da organização. A SOS Mata Atlântica é uma ONG brasileira que desenvolve projetos e campanhas em defesa das Florestas, do Mar e da qualidade de vida nas Cidades. Saiba como apoiar as ações da Fundação em www.sosma.org.br/apoie.

Compartilhar nas redes: