Coalizão Pró-UCs divulga posicionamento contra fusão entre ICMBio e Ibama

11 de February de 2021

A Coalizão Pró-Unidades de Conservação da Natureza (Pró-UCs) e a Comissão Mundial de Áreas Protegidas da IUCN vêm a público manifestar indignação e total desaprovação à tentativa de fusão entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A iniciativa vem sendo considerada por um Grupo de Trabalho (GT), instituído pelo Ministério do Meio Ambiente, composto majoritariamente por militares e sem a participação da sociedade civil. Na configuração atual, as duas autarquias assumem vocações distintas e igualmente complementares aos planos de proteção da biodiversidade e gestão dos recursos naturais do país. Criado em 1989 pela Lei nº 7.735, o Ibama é responsável pelo licenciamento, fiscalização, controle e monitoramento dos processos ambientais. O ICMBio, por sua vez, foi instituído pela Lei n° 11.516, no ano de 2007, a partir do seu desmembramento do Ibama, com o objetivo de melhorar a divisão de papéis entre os órgãos e, assim, focalizar na implementação e gestão das Unidades de Conservação (UCs) federais, que hoje representam 9% do território terrestre nacional e 24% do marinho. Para além da importante missão de conservar nossa biodiversidade e atuar como barreira ao desmatamento, um dos mais graves problemas ambientais enfrentados pelo Brasil, as UCs também contribuem para o desenvolvimento socioeconômico do país, movimentando a cadeia turística e gerando emprego e renda às comunidades do seu entorno. Em 2018, a visitação aos parques e outras UCs federais sustentou cerca de 90 mil empregos e gerou R$ 2,7 bilhões em renda, R$ 3,8 bilhões em valor agregado ao PIB e R$ 1,1 bilhão em impostos, segundo estudos do próprio ICMBio. Nos últimos dez anos, a visitação pública em UCs federais teve um aumento de 400%, saltando de 3,6 milhões de pessoas em 2008 para 15,3 milhões em 2019. Isso é reflexo do trabalho ICMBio e demonstra como a criação de uma autarquia especializada na gestão de UCs permitiu o aperfeiçoamento de uma série de instrumentos e mecanismos, cujo resultado tem sido o avanço na gestão. Outra evidência desse avanço é a elaboração e aplicação dos planos de manejo das unidades, que registraram um crescimento de 250% desde a criação do órgão, passando de 78 UCs com plano de manejo em 2007 para 195 em 2018. O ICMBio também tem atuado proativamente na construção de mecanismos e de outros instrumentos com vistas à consolidação territorial das UCs. Exemplo disso são as ações da frente de regularização fundiária, processo historicamente complexo e que tem sido assumido com responsabilidade pelo órgão. Hoje, das 334 Unidades de Conservação federais sob sua gestão, 267 já são de domínio público e devem ser transferidas à autarquia. Não obstante, os últimos anos foram marcados pelo aumento do número de famílias cadastradas em Reservas Extrativistas e categorias similares, tendo saltado de 3 mil em 2010 para 52 mil em 2020. Aliás, vale ressaltar: na última década, o ICMBio tem ajudado a desenvolver a produção de comunidades extrativistas e indígenas na Amazônia e nos demais biomas, fortalecendo cadeias produtivas da sociobiodiversidade, como açaí, castanha, andiroba, entre outros. Esse é um dos diversos trabalhos assumidos exclusivamente pelo órgão, que hoje é a única instituição pública que contribui diretamente para a consolidação desses produtos e para a proteção desses modos de vida, de seus direitos e de sua reprodução cultural. Com efeito, o papel promotor de desenvolvimento das UCs é inerente à vocação do ICMBio, o que reforça a necessidade de manutenção e fortalecimento da instituição, como ferramenta fundamental para sustentabilidade da governança socioambiental brasileira. E num momento em que entidades federais e o próprio MMA têm avançado em projetos de parcerias e concessões de parques e florestas nacionais com o objetivo de impulsionar economicamente regiões com enorme potencial de turismo, é imperativo que se conte com a experiência do ICMBio como uma forma de monitorar e gerir com excelência os contratos efetivados, conferindo maior segurança e atratividade a potenciais parceiros privados, além de garantir que melhores serviços de visitação e apoio ao uso público sejam de fato oferecidos à sociedade. Esses dados permitem visualizar os significativos avanços que o Brasil alcançou ao longo desses últimos 13 anos, por contar com uma instituição especializada e focada exclusivamente na gestão de UCs. Mesmo diante de todas as limitações orçamentárias e de quadro de pessoal, os avanços foram significativos. E, num momento em que a agenda ambiental resiste sob constantes ameaças de retrocessos, prever a possibilidade de fusão é incorrer no risco de provocar uma profunda desorganização e desmobilização dos processos, das normativas, dos instrumentos e de todo o sistema de gestão das UCs federais, além das consequentes perdas de foco, eficiência, qualidade e eficácia conquistadas nos últimos anos. Essa medida ainda reforçaria a mensagem de diminuição das salvaguardas ambientais aos países com os quais o Brasil desenvolve relações comerciais, comprometendo profundamente as tratativas econômicas internacionais. Ademais, a extinção do ICMBio caminharia na contramão das boas práticas internacionais, cuja gestão das áreas protegidas é respaldada sob a gerência de uma ou mais instituições específicas a esse propósito, como é o caso de Estados Unidos, Canadá, Austrália, Chile e África do Sul. Como coletivos representantes da sociedade civil atuando em prol de melhores e mais eficientes formas de proteger e conservar o patrimônio natural brasileiro, para essa e as futuras gerações, a Coalizão Pró-UC e a Comissão Mundial de Áreas Protegidas da IUCN posicionam-se radicalmente contrária à possibilidade de fusão estudada pelo GT. Antes de abdicar de um arranjo institucional qualificado e com resultados comprovados, deve-se considerar todo o potencial de que o ICMBio dispõe para avançar na agenda e em seu próprio desempenho. Somos favoráveis à manutenção e ao fortalecimento do ICMBio. Na prática, isso implica investir em inovação, ampliar parcerias com as organizações da sociedade civil e/ou com o setor privado, e também diversificar suas fontes de financiamento como forma de garantir à sociedade um retorno ainda maior das UCs que administra. O projeto em análise junto ao GT é mais uma tentativa de enfraquecimento da gestão das Unidades de Conservação brasileiras. O verdadeiro ganho de eficiência provém, justamente, do fortalecimento dessas instituições, e não da possibilidade de fundi-las, descaracterizando suas vocações e propósitos, negligenciando também todo o legado de conquistas e êxitos alcançados nos últimos anos. Não se pode pensar no desenvolvimento presente e futuro da sociedade brasileira sem políticas fortes de conservação e salvaguardas de biodiversidade, já que ela é a base de atividades econômicas que, mesmo com os inúmeros avanços tecnológicos, são extremamente dependentes da natureza para continuar existindo. Sobre a Coalizão Pró-UCs A Coalizão Pró-UCs (Pró Unidades de Conservação da Natureza) é uma rede de instituições da sociedade civil, que tem como objetivo promover, junto à sociedade, o que consideramos as melhores e mais eficientes formas de proteger e conservar o patrimônio natural brasileiro, para essa e as futuras gerações. Para tanto, promove a articulação entre os setores, o debate junto à sociedade e desenvolve estratégias para o fortalecimento das UCs (Unidades de Conservação) em todo o território nacional. Integram a Coalizão, o WWF-Brasil, a Fundação SOS Mata Atlântica, a TNC (The Nature Conservancy), a CI-Brasil (Conservação Internacional), Fundação Grupo Boticário para a Conservação da Natureza, o Instituto Semeia, Rede Nacional Pró Unidades de Conservação, o Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola), o IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas) e a UICN-Brasil (União Internacional para a Conservação da Natureza).

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