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01 de April de 2025
Carlos Abras, gerente de captação, para O Eco
Tem sido comum a criação e/ou adoção de termos para significar determinadas narrativas nas diversas instâncias de diálogo de nossa sociedade. Tipping Point, por exemplo, representa um potencial “ponto de não retorno ou inflexão” da crise climática e de biodiversidade global.
Por curiosidade, “ponto de não retorno” foi uma expressão utilizada na Primeira Guerra Mundial e indicava o nível de combustível mínimo para que um piloto pudesse voltar vivo à sua base depois de alcançar a sua missão. Já “ponto de inflexão é quando uma pequena mudança faz uma grande diferença para um sistema (Gladwell, 2000) ou quando uma série de pequenos incidentes é o suficiente para causar uma mudança maior e mais importante” (Oxford English Dictionary).
A partir desta definição, no contexto das mudanças climáticas, se temos, por um lado, as questões relacionadas ao aquecimento global, perda de biodiversidade e ecossistemas, desmatamento, poluição dos recursos hídricos, uso intensivo de combustível fóssil, desinformação; por outro, existem uma série de acontecimentos positivos que buscam reverter este cenário de degradação. Políticas públicas e regulamentações mais rigorosas, o avanço da ciência, investimentos em tecnologia e energia renovável, a maior conscientização do mercado consumidor e da sociedade são bons indicadores para enfrentar este desafio global.
Enquanto isto, o tempo não para e corremos o risco de o futuro repetir o passado. É evidente a lacuna entre o discurso e a prática. E a pouca disponibilidade e restrições do acesso ao fluxo do capital público e privado para enfrentar a crise climática e de perda da biodiversidade se tornam barreiras para implementação, com dúvidas sobre perspectivas futuras de alguma mudança que possa alterar o estado de um sistema. E é aí que entra o financiamento e a filantropia.
A 5° edição de 2024 do Climate Works Foundation, como indicador de referência, aponta que no ano de 2023 apenas USD 15.8 bilhões de USD 885 bilhões transacionados, entre capital filantrópico de fundações e indivíduos, foram destinados para esforços de mitigação e/ou iniciativas de conservação. Ou seja, 2% do total de doações. Em direção contrária, o Fundo Monetário Internacional (FMI) estima que o petróleo, o carvão e o gás recebem cerca de US$ 5,3 trilhões em subsídios, o que representa 6,3% do PIB (Produto Interno Bruto) global.
E, neste horizonte, ao som de Gilberto Gil “Andar com fé eu vou. Que a fé não costuma faiá”, negociadores travam uma batalha incansável para viabilizar os recursos necessários e colocar em marcha os vários compromissos internacionais, como o Global Biodiversity Framework Fund (GBF) – que tem como meta a mobilização de 200 bilhões de dólares por ano até 2030 para a conservação da biodiversidade, mas que mobilizou pouco mais de US$ 407 milhões ao longo dos últimos dois anos; e a proposta brasileira para a criação do Tropical Forest Fund Facility (foto de capa) que é um novo mecanismo de financiamento em conservação de florestas tropicais para países em desenvolvimento, cuja meta é de USD 122 bilhões. Enfim, são muitas frentes.
O conhecimento e as evidências são irrevogáveis. Segundo o observatório Copernicus, da União Europeia, 2024 foi o ano mais quente da história, com aumento inédito de 1,6°C em relação à média de temperatura registrada no planeta na era pré-industrial. As crises do clima e da natureza estão profundamente interligadas, criando ciclos de feedback perigosos para as pessoas e o planeta. Perdas e danos estão na ordem do dia. Estima-se que os prejuízos materiais com a tragédia recente no Rio Grande Sul somam mais de R$ 37 bilhões (Folha de S. Paulo). Dos recentes incêndios na Califórnia, nos EUA, estimam na ordem de USD 60 bilhões. Relatório da PWC (Gerenciando riscos da natureza: da compreensão à ação / 2013) também destaca esta correlação ao apontar que 55% do PIB Global – equivalente a cerca de USD 58 trilhões é moderadamente ou altamente dependente da natureza.
O Brasil, nossos biomas, necessitam de uma atenção especial. A Mata Atlântica, por exemplo, lar de 145 milhões de brasileiros e onde se gera 80% do PIB nacional, com ampla atividade industrial, agrícola e urbana, precisa estar e ser considerada no radar do fluxo de financiamento e filantropia global. Neste ano, teremos a COP30 em Belém e queremos ver a implementação das promessas que, sem os recursos necessários, ficarão apenas no papel.
Chegou a hora de testemunharmos o “Tipping Point” do financiamento global para combater a crise climática, de perda da biodiversidade e dos recursos hídricos. Chegou a hora pela qual a disponibilidade dos recursos financeiros dentro do que se espera do ideal seja uma realidade de não retorno e um ponto de inflexão ao ponto de atingirmos uma mudança no sistema em que que poderemos, finalmente, vivenciar a implementação e sonhar com estabilidade climática para a nossa e futuras gerações sem precisar correr pra Marte.