Menos de 10% da Mata Atlântica está protegida por Unidades de Conservação, mostra estudo inédito

28 de May de 2025

Levantamento da SOS Mata Atlântica detalha a proteção do bioma e propõe caminhos para fortalecer a efetividade das áreas protegidas

Um estudo inédito da Fundação SOS Mata Atlântica revela que apenas 12,86 milhões de hectares da Mata Atlântica estão protegidos por Unidades de Conservação (UCs) – o equivalente a 9,8% da área total abrangida pela Lei da Mata Atlântica. O número, ainda muito abaixo do necessário, acende o alerta sobre a fragilidade do bioma mais ameaçado do país.

As Unidades de Conservação são áreas legalmente instituídas para preservar a biodiversidade, garantir serviços ambientais fundamentais (como regulação do clima e abastecimento de água) e promover o uso sustentável dos recursos naturais. No Brasil, são regulamentadas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), que as divide em duas grandes categorias: Proteção Integral, com uso humano restrito a atividades como pesquisa, turismo ecológico e educação ambiental, e Uso Sustentável, que busca conciliar conservação com outros usos e atividades humanas.

Para chegar aos dados, a SOS Mata Atlântica considerou toda a área de aplicação da Lei da Mata Atlântica e os polígonos das UCs nesse território, eliminou e qualificou sobreposições entre UCs (casos em que duas ou mais unidades ocupam o mesmo território) e analisou a representatividade ecológica das áreas, ou seja, o quanto abrigam as diferentes formações vegetais do bioma.

O levantamento também examinou os usos do solo dentro das UCs, identificando a presença de atividades como pastagens, agricultura e áreas degradadas em espaços que deveriam estar voltados prioritariamente à conservação. Apenas como exemplo, quase 2 milhões de hectares das UCs da Mata Atlântica são áreas de pasto. Embora as Unidades de Conservação desempenhem um papel essencial na proteção da Mata Atlântica, a maior parte da vegetação nativa remanescente – mais de 80% – ainda está fora dessas áreas legalmente protegidas.



Isso reforça a importância do cumprimento da Lei da Mata Atlântica para proteção dos fragmentos florestais, em especial as florestas em estágio médio e avançado de regeneração, e da implementação do Código Florestal. Por outro lado, existe um grande espaço para o país avançar na criação de novas UCs, com categorias adequadas às realidades locais, para reforçar a proteção do bioma. Além disso, a rede de UCs apresenta uma distribuição desigual: predominam nas regiões litorâneas e serranas, enquanto grandes áreas do interior seguem sem proteção adequada.

As UCs de Proteção Integral se destacam pelo grande percentual de formações naturais em relação à área total desse grupo, com mais de 90% de cobertura de vegetação nativa. Já nas de Uso Sustentável, essa taxa cai para 49,5% – o restante é majoritariamente ocupado por pastagens, agricultura e mosaicos de uso agropecuário.

Foram identificados ainda cerca de 1,16 milhão de hectares de sobreposição entre UCs, sobretudo entre Áreas de Proteção Ambiental (APAs) e outras categorias. Algumas sobreposições são esperadas, como entre UCs de Proteção Integral e APAs, onde as APAs acabam atuando como zonas de transição e regulação das atividades antrópicas, fortalecendo a conservação de UCs sobrepostas. Entretanto, existe um grande território onde ocorrem sobreposições entre diferentes APAs, inclusive na mesma esfera de gestão, o que exige atenção do poder público para o alinhamento de normas e outras atividades de gestão.

Papel na regulação climática

Para Diego Igawa Martinez, biólogo e coordenador de projetos da SOS Mata Atlântica, ainda há um longo caminho para tornar a rede de áreas protegidas à altura da complexidade e da importância do bioma. “A floresta está fragmentada, a proteção é mal distribuída e muitas unidades não conseguem cumprir o papel que deveriam. É imperativo avançar na criação de novas áreas, mas de forma estratégica e fortalecendo também a implementação de todo o sistema. Esperamos que esse estudo traga uma contribuição para repensar como e onde protegemos. Precisamos de estratégias mais integradas, que considerem o território, a biodiversidade e também as pessoas”, afirma.

O estudo também destaca a importância das Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs). Com mais de 80% dos remanescentes florestais em propriedades privadas, ampliar os incentivos à criação e manutenção dessas reservas é uma estratégia essencial para fortalecer a rede de proteção. “Os dados mostram onde estão as lacunas, mas também apontam os caminhos: ampliar e qualificar as áreas protegidas, restaurar regiões degradadas e valorizar o papel de quem já contribui com a conservação”, complementa Martinez.

Em um contexto de crise climática, as Unidades de Conservação ganham ainda mais relevância por seu papel na regulação climática, no armazenamento de carbono e na resiliência dos ecossistemas. Mas a atual cobertura ainda é insuficiente para dar uma resposta à altura dos desafios climáticos.

O estudo reforça ainda o vínculo com a meta “30x30”, estabelecida pelo Marco Global da Biodiversidade e assumida pelo Brasil em sua Estratégia e Plano de Ação Nacional para Biodiversidade (EPANB). O compromisso prevê que ao menos 30% das áreas terrestres e marinhas estejam protegidas até 2030. Na Mata Atlântica, com menos de 10% efetivamente protegidos, o desafio é grande – e urgente.

“As soluções estão ao nosso alcance, mas exigem vontade política, recursos e articulação com quem vive e cuida desses territórios. Criar novas unidades, restaurar áreas degradadas e valorizar quem já protege a floresta são passos fundamentais para garantir o futuro da Mata Atlântica”, aponta Luís Fernando Guedes Pinto, diretor executivo da SOS Mata Atlântica.

Acesse o estudo completo aqui.



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